terça-feira, 30 de dezembro de 2008

O (possível) xeque-mate israelense


Israel e o Hamas não lutam apenas fisicamente. Existe um cenário bastante complexo que envolve a batalha da inteligência. Ambas as partes precisam mostrar que escolheram a estratégia de combate mais eficiente. E, num mundo onde as imagens valem mais do que a razão, é preciso mostrar aos atores internacionais quem é capaz de ser mais destruído pelo outro.

Mais do que isso, Israel e Hamas escolheram estratégias de combate parecidas, cuja diferença fica por conta apenas da intensidade dos ataques.

Desde 2001, o grupo extremista palestino ataca à conta-gotas com o lançamento dos mísseis Qassam. O potencial de destruição é o que menos importa. O fato é que quase 30 mil desses mísseis já foram lançados sobre o Estado Judeu, na tentativa de tornar a situação insustentável, resultando em duas alternativas já conhecidas: um ataque – limitado – por parte de Israel; ou a assinatura de um cessar-fogo favorável que, como em outras oportunidades, daria ao Hamas o tempo necessário para receber mais armamento de Irã e Síria.

Neste momento, entretanto, Israel rompeu com a lógica do conflito, e é isso o que Olmert quer dizer ao mencionar o objetivo de mudar as regras do jogo com os ataques em larga escala. Para o jornalista e blogueiro do Jerusalém Post Shmuel Rosner, ao contrário do que muitos sustentam – e eu me incluo dentre eles – a atual ofensiva israelense não pretende se estender por muito tempo.

Para ele, Israel sabe que não existe a possibilidade de acabar definitivamente com o Hamas. Como disse um líder do grupo, na ausência dos terroristas mortos, muitos outros estão dispostos a dar a vida pela destruição do Estado Judeu.

Israel sabe disso tudo, até porque aprendeu com a guerra no Líbano de 2006 que os ataques aéreos não foram capazes de acabar com o Hezbolah. E hoje tampouco podem riscar o Hamas do mapa.

Depois do fracasso da conduta do governo durante o conflito de 2006 – que gerou inclusive o relatório Winograd, da Suprema Corte israelense, condenando a atuação de várias autoridades durante a guerra – a moribunda administração Olmert promete não repetir os erros cometidos há dois anos e meio. Para isso, pretende usar a seu favor uma das vozes mais críticas à atual ação militar: a comunidade internacional.

Como Israel não tem qualquer diálogo com o Hamas, o objetivo do governo de Jerusalém seria causar tanta destruição à infra-estrutura de Gaza, que as maiores potências internacionais e da região se veriam obrigadas a intervir diplomaticamente. Como Israel faz questão de reforçar a cada instante, a ofensiva foi deflagrada para acabar com o lançamento de mísseis sobre as cidades do sul do país.

Países árabes e a própria Liga Árabe deverão – numa seqüência lógica prevista pelo governo israelense –, diante da destruição causada pela ofensiva, articular com o Hamas um cessar-fogo no qual o grupo abdicaria de qualquer futuro lançamento de mísseis em troca do fim dos ataques israelenses.

Nesta futura trégua – de caráter permanente por exigência de Israel – o Hamas se veria encurralado de duas formas: o mundo jamais esqueceria quem seria o culpado por uma eventual escalada de violência caso novos mísseis fossem lançados sobre território israelense; e o Hamas passaria a fazer o serviço de Israel, já que seria também responsável por monitorar atividades terroristas de outros grupos atuantes em Gaza, como a Jihad Islâmica.

E ainda, de acordo com este possível encadeamento de idéias, o cessar-fogo beneficiaria o atual governo de várias maneiras: reabilitaria o primeiro-ministro, Ehud Olmert, que está para deixar o cargo com o peso do fracasso em 2006; impulsionaria as candidaturas de Tzipi Livni e Ehud Barak; e, finalmente, escreveria o nome desses três personagens na história de Israel como os responsáveis por acabar com o lançamento de mísseis que, desde 2001, impede os moradores do sul do país (cerca de meio milhão de pessoas) de viver com tranqüilidade.

A estratégia não deixa de ser ambiciosa. Mas as autoridades israelenses viram nesta crise grandes oportunidades de resolver problemas de fato e acrescentarem um enorme feito político a suas próprias biografias. Só o tempo pode responder se tudo vai correr como eles previram. Para que tudo isso aconteça, o xeque-mate israelense já foi dado.

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