
Assim como no Holocausto, a caça promovida nos dias atuais é injustificada. Os argumentos de Paris seriam risíveis, se não fossem trágicos. Por exemplo, quando o governo francês denuncia a falta de higiene dos acampamentos, esquece de mencionar os motivos por trás da ausência de estrutura digna. Lei nacional estabelece como obrigação de cidades com mais de 5 mil habitantes fornecer eletricidade, rede de esgoto e água para os acampamentos. Mas a determinação é ignorada pelas autoridades locais.
É preciso deixar claro que Sarkozy age em benefício próprio. Com a popularidade em baixa, as medidas restritivas aos ciganos ajudaram a melhorar a percepção sobre seu governo. Antes de determinar as expulsões, a aprovação do presidente estava em 34%. Agora, está em 36%. Os muito insatisfeitos caíram de 66% para 64%.
Dá para concluir que não é possível culpar apenas as autoridades. Principalmente quando se leva em consideração que dois terços dos franceses aprovam as medidas.
Além da desumanidade envolvida, o gesto também desrespeita a legislação europeia. Como a maior parte dos ciganos possui cidadania romena ou búlgara – países que entraram para a UE em 1 de janeiro de 2007 –, eles não poderiam ser impedidos de circular pelos demais Estados-membros do bloco. Paris argumenta que, por conta da adesão recente, búlgaros e romenos só poderiam usufruir da cláusula de livre movimentação a partir de 2014.
O que pouca gente se recorda é que a Comissão Europeia - órgão executivo do bloco - criou um fundo de 22 bilhões de dólares para ser usado na melhoria das condições de vida dos ciganos. O dinheiro permanece intocado, mesmo neste momento de dificuldades.
Editorial do Washington Post lembra um ponto importante. A guinada de Sarkozy pode marcar o início de um processo de mudança interna na França. Ao eleger os ciganos como os culpados pela criminalidade nacional, o governo pode também sinalizar uma nova abordagem em relação aos milhões de imigrantes que vivem no país.
Até o momento, a lei determina que crianças nascidas em território francês devem receber cidadania automaticamente. O ministro do Interior, Brice Hortefeux, pretende mudar isso, por ora em casos onde os pais tenham sido condenados criminalmente por ataques a policiais ou bombeiros. Se isso de fato vier a acontecer, a França poderá assistir a uma perigosa onda de caça aos imigrantes. Não se sabe como os seis milhões de franceses de origem árabe, por exemplo, poderiam reagir diante deste novo posicionamento oficial.